
Em casa tem um pé de jabuticaba. Eu acho aquela árvore curiosa. Aquelas bolinhas arroxeadas quase pretinhas dependuradas no tronco parecem enfeitar a árvore graciosamente. Confesso que levei um tempo para experimentá-las.
Também demorei para seguir rotinas. Hoje eu tenho algumas delas. Não que eu goste. Na verdade, eu quase as abomino. Atualmente, para as idas presenciais ao meu trabalho, passo pelo mesmo local todas as manhãs.
Todos os dias, em meio a minha trajetória, naquele mesmo banco, em frente da mesma loja, um senhor está sentado com as mesmas roupas e as duas sacolas retornáveis, daquelas de se fazer supermercado.
Ele olha atentamente para todos que passam como se esperasse alguém ou alguma coisa. Todos os dias, ao passar naquele intervalo de uma hora pela manhã, lá está aquele senhor.
Todos os dias eu me perguntava: Quem será? O que está esperando? Qual deveria ser a sua história?
Ensaiei diversas vezes parar, sentar, conversar e perguntar. Todos os dias, as mesmas perguntas internas, ensaios e finalmente desistência. Seria apenas curiosidade? O que fazer com as informações? E se a resposta for triste? Como ele deve ficar diante das perguntas e mesmo das suas próprias respostas? Cheguei a conclusão de que a minha curiosidade não traria benefícios, especialmente a ele. Resolvi não perguntar ainda que todos os dias eu passasse por lá.
Em ocasiões em que o frio em São Paulo se acirra eu me pergunto se ele está bem e espero vê-lo inteiro no dia seguinte. As minhas indagações parecem supérfluas.
Neste ano, a jabuticabeira foi bondosa e rendeu várias frutinhas. Preparei alguns pacotinhos para levar para algumas pessoas que vejo todos os dias, alguns colegas de trabalho.
Ao sair de casa, fiquei pensando no senhor do banco de todo dia. Afinal, ele é uma das pessoas que vejo diariamente. Ensaiei o restante do caminho sobre o que dizer até chegar ao banco. Me aproximei enquanto ele removia a máscara para beber água. Foi a primeira vez que vi além dos olhos com traços orientais.
Soltei logo um – Bom dia, senhor! a que ele respondeu – Bom dia, simpaticamente.
– O senhor gosta de jabuticaba? A pergunta repentina e desconexa fez com ele parasse, pensasse por um tempo. Ele acenou positivamente com a cabeça.
– Tenho algumas jabuticabas do pé lá de casa. O senhor quer?
– Sim, eu quero. As frutas naturais, sem agrotóxico são sempre melhores.
Ele as recebeu com as duas mãos, agradeceu e as guardou em uma das duas sacolas.
Silêncio.
– Bem. já vou indo. Até mais.
– Muito obrigada senhora, bom trabalho.
Agora sei que ele gosta de jabuticabas e ele sabe que a senhora de andar corrido de todo dia tem um pé de jabuticaba com frutinhas que se assemelham aos enfeites das árvores de natal.
Tempos depois, conversamos durante uma manhã, nos apresentamos e ele me contou um pouco da sua história. Faz três semanas que não o vejo sentado no banco. Nunca senti tanta falta de uma rotina.